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O samba das tarifas: quando a política internacional vira disputa de ego

Presidente brasileiro endurece discurso e sinaliza que país não aceitará novas barreiras comerciais sem resposta

30/01/2025 às 14h54 Atualizada em 30/01/2025 às 15h27
Por: Prof. Helle Borges
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Imagem/ - IA/Rádio Cidade
Imagem/ - IA/Rádio Cidade

Se a política internacional fosse um samba, a reciprocidade seria o compasso certo para não perder o ritmo. O recente embate entre Luiz Inácio Lula da Silva e Donald Trump mostra que as tarifas comerciais ainda são um dos instrumentos preferidos para tocar essa melodia — ou, dependendo da perspectiva, desafinar a harmonia global.

Ao anunciar que o Brasil responderá com reciprocidade a eventuais tarifas impostas por Trump, Lula não está apenas jogando uma carta técnica, mas também uma jogada política calculada. Esse princípio da reciprocidade, consagrado pelo GATT e reforçado pela Organização Mundial do Comércio (OMC), funciona como aquele acordo tácito entre colegas de trabalho: “Você pisa no meu calo, e eu devolvo na mesma moeda”. Parece simples, mas, como sempre, a execução pode ser um tanto mais complicada.

Trump, que nunca escondeu seu amor por tarifas como ferramenta de política externa, parece mais uma vez inclinado ao protecionismo clássico. Ele já usou isso contra a China e outros países sob a justificativa de proteger a indústria americana. Agora, parece querer testar a paciência brasileira. No entanto, o Brasil não é um alvo fácil. Nossa economia, embora vulnerável em alguns aspectos, tem um peso considerável nas cadeias globais de alimentos e energia. Mexer com nossas exportações pode significar preços mais altos para consumidores americanos e insatisfação dentro de setores estratégicos dos EUA.

Lula, por sua vez, sabe que um discurso firme sobre soberania ressoa bem dentro de casa. Afinal, ninguém quer ver seu país se curvando a interesses estrangeiros. O recado não é só para Trump, mas também para os produtores brasileiros de carne, grãos e minérios, que precisam sentir que têm o governo ao seu lado. No entanto, sob o discurso de soberania e reciprocidade, existe uma realidade delicada: retaliações econômicas, quando mal gerenciadas, tendem a gerar efeitos colaterais para os dois lados. É como uma briga de vizinhos em que ambos terminam reclamando do barulho.

No curto prazo, uma retaliação moderada pode ser vantajosa, mostrando ao mercado interno que o Brasil não aceita ser tratado como segundo plano. Mas o perigo está na escalada. Se o Brasil taxar produtos estratégicos americanos, como etanol ou produtos tecnológicos, os EUA podem reagir ampliando suas medidas, criando um ciclo difícil de romper. Essa dinâmica é conhecida nos círculos diplomáticos como “guerra comercial”, mas, para os produtores e consumidores, soa mais como uma guerra de preços.

É aqui que entra a importância da diplomacia. O Brasil, tradicionalmente habilidoso em negociar acordos complexos, precisa encontrar um ponto de equilíbrio: mostrar firmeza sem fechar portas. Enquanto Trump pode usar tarifas como ferramenta política doméstica — uma tentativa de agradar setores conservadores e nacionalistas —, Lula joga para uma audiência mais ampla, buscando afirmar o Brasil como uma liderança independente no cenário internacional.

No fim das contas, essa disputa é menos sobre tarifas e mais sobre quem dita as regras do jogo. Trump quer reafirmar o domínio americano; Lula quer mostrar que o Brasil não é um mero espectador. Mas, como todo bom jogo de xadrez, a vitória não está na força da peça, mas na estratégia. Lula, ao evocar reciprocidade, oferece um convite velado para negociações — porque, no fundo, ele sabe que a última coisa que o mundo precisa agora é de mais um samba de tarifas desafinadas.

 

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