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Política Artigo Especial

Insalubridade na Educação: o silêncio cúmplice sobre uma realidade inaceitável

Enquanto prefeituras ignoram laudos e decisões judiciais, professores seguem adoecendo em salas sem estrutura, expostos a riscos biológicos e emocionais que violam o direito à dignidade no trabalho.

06/05/2025 às 12h04
Por: Prof. Helle Borges
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Imagem - IA/Rádio Cidade
Imagem - IA/Rádio Cidade

Nos discursos oficiais, a escola é tratada como o “berço do futuro” e o educador como “herói da transformação social”. Palavras bonitas, que enchem palanques, redes sociais e eventos comemorativos. Mas basta sair do script para encarar a dura verdade: por trás de toda essa retórica de valorização, o que se impõe é o abandono. E a insalubridade nas condições de trabalho é uma das expressões mais cruéis dessa contradição.

Sim, é insalubre educar

É insalubre enfrentar salas superlotadas, mal ventiladas e barulhentas. É insalubre lidar, diariamente, com o adoecimento físico e emocional provocado pela sobrecarga de trabalho, pela pressão de metas inatingíveis e, muitas vezes, pela indiferença do próprio sistema que deveria proteger o educador.

A exposição a agentes biológicos — como vírus, bactérias e fluidos corporais — é rotineira, especialmente na Educação Infantil, onde professores e auxiliares realizam atividades de higiene com as crianças, trocam fraldas, limpam secreções e acalmam febres. Isso se enquadra perfeitamente no que a NR-15, norma do Ministério do Trabalho, classifica como atividade insalubre.

Mas o problema vai além do biológico. A educação brasileira adoece seus profissionais com salas sem estrutura, ausência de climatização, falta de equipamentos de proteção individual e ruído constante. Soma-se a isso o abuso vocal, o estresse contínuo, o risco de violência física e psicológica — inclusive por parte de alunos e familiares — e temos um cenário de calamidade.

E aqui é importante dizer sem rodeios: essa não é uma realidade isolada ou pontual. É um problema nacional. Adoece-se em escolas públicas do Norte ao Sul do Brasil. Em municípios pequenos e em capitais. A precariedade da estrutura educacional é um traço comum daquilo que se convencionou romantizar como “vocação”, quando na verdade se trata de abandono institucionalizado.

Enquanto isso, muitos prefeitos, secretários e técnicos fingem não ver. Alegam falta de recursos ou esperam por decisões judiciais que os “obrigue” a agir. Uma desculpa cínica diante do fato de que vários municípios brasileiros já reconhecem o direito à insalubridade na educação.

- Em São Paulo, auxiliares de desenvolvimento infantil recebem o adicional;
- Em Curitiba, cuidadores escolares têm o mesmo direito reconhecido;
- Em Belo Horizonte, decisões judiciais obrigaram a prefeitura a pagar;
- Em Porto Alegre, acordos sindicais garantem a inclusão.

Ou seja: quem quer, reconhece. Quem não quer, empurra com a barriga.

É inaceitável que o profissional da educação tenha que adoecer para ser ouvido, e ainda precise entrar na Justiça para receber aquilo que deveria ser garantido por justiça e bom senso. A insalubridade na educação não é exceção: é regra. O que falta é coragem política para encarar os laudos, ouvir os educadores e reconhecer que ensinar, hoje, custa caro à saúde de quem ensina.

Não reconhecer a insalubridade é ser cúmplice da omissão

É fingir que a sala de aula é um jardim florido, quando ela está mais para trincheira.
É deixar o professor exposto, sem proteção, enquanto a máquina pública distribui homenagens vazias e discursos genéricos no Dia do Professor.

A luta pelo reconhecimento da insalubridade na educação é uma luta por dignidade. Por respeito. Por sobrevivência.

Lanço aqui um desafio público aos prefeitos da nossa região: tenham a coragem de liderar esse debate em Santa Catarina. Façam história. Sejam os primeiros a reconhecer oficialmente o que o Brasil inteiro já vê. E ao governador do Estado, fica o apelo: transforme Santa Catarina em referência nacional na valorização concreta dos educadores.

Reconhecer a insalubridade é um ato de justiça. Negá-la é manter-se cúmplice da omissão. Ou os governos reconhecem isso de forma urgente — ou assumem, de vez, que preferem a retórica à responsabilidade.

 

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