Bruno Lima Fraga tem 38 anos, nasceu em Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, e há seis anos, o gaúcho escolheu Itapema, em Santa Catarina, para morar. Residente no bairro Casa Branca, Bruno é um apaixonado pelas artes marciais — sua disciplina e perseverança nas lutas refletem sua determinação. Atualmente, ele ostenta a faixa azul em jiu-jitsu, conquistada na academia Gracie Barra, da cidade. Além disso, dedica-se ao karatê Shotokan há impressionantes 22 anos, com a faixa marrom conquistada em uma academia tradicional de Porto Belo.
Casado há 16 anos com Mônica Luiza Dolenkei, que permanece em Itapema enquanto ele está na Europa, Bruno vive uma rotina dividida entre a família e seu chamado para o serviço militar, que o levaria muito além de casa.
Desde o início da invasão russa na Ucrânia, Bruno sempre foi um crítico ferrenho do conflito. Em suas próprias palavras, ele define a guerra como "uma covardia com a Ucrânia". No começo, ele e muitos que compartilhavam do mesmo pensamento só podiam assistir, impotentes, às “atrocidades” que eram cometidas, observando de longe os acontecimentos que mudariam a geopolítica mundial.
A guerra, que teve início em fevereiro de 2014, foi se intensificando, mas a resistência ucraniana também se organizava. O governo da Ucrânia passou a oferecer documentação oficial para estrangeiros que quisessem se alistar e defender o país, um convite para quem desejasse unir-se a essa luta pela soberania e liberdade.
Foi nesse cenário que Bruno enxergou uma oportunidade única — a chance de integrar às forças de segurança ucranianas e fazer a diferença em uma causa que ele considerava justa. Porém, naquele momento inicial, as dificuldades financeiras foram um obstáculo. “Para ir até a Europa, teria que custear tudo do meu próprio bolso, e não tinha condições”, explica Bruno.
Durante esse período, ele não perdeu tempo. Intensificou seu preparo físico e emocional, ciente de que, quando a oportunidade surgisse, estaria pronto para o desafio. Ele treinou e trabalhou como personal trainer em uma academia tradicional no bairro Morretes, fortalecendo seu corpo e mente.
Em 2025, após anos de espera, Bruno finalmente viu a chance de se juntar às forças ucranianas e fazer parte da linha de frente a mais de 11.500 km de Santa Catarina. Por indicação de um amigo, ele conseguiu se alistar no GUR — a Direção Principal de Inteligência da Ucrânia. Este órgão é o serviço de inteligência militar do país, equivalente a uma espécie de “CIA militar”, responsável por informações estratégicas essenciais para o conflito, com treinamento integrado às forças do exército ucraniano.
A conquista de Bruno representa mais do que um simples alistamento: é a realização de um sonho e o orgulho de estar ao lado de outras pessoas que compartilham sua disposição e vontade de ajudar a Ucrânia. Ele destaca a importância de seu papel, principalmente porque, após anos de guerra, a Ucrânia sofreu uma grande evasão de homens — muitos deixaram o país em busca de segurança para suas famílias, tornando a presença de voluntários estrangeiros ainda mais necessária.
Para fazer parte do exército, Bruno precisou cumprir etapas burocráticas e práticas. Tirar o passaporte, obter uma carta convite oficial da Ucrânia e escolher em qual frente de combate atuaria. Entre as opções estavam a Legião Estrangeira internacional, o Exército regular ucraniano ou a Guarda Nacional. Essas forças têm como missão principal impedir o avanço das tropas inimigas e defender cada centímetro do território ucraniano. Apesar das opções disponíveis, Bruno foi selecionado para integrar a GUR — a força especial responsável pela inteligência militar ucraniana, conquistando uma vaga em uma unidade especial de elite.
A ida
Bruno viajou sozinho para um dos maiores desafios de sua vida: lutar na guerra da Ucrânia. Ele não conhecia nada sobre o país, não sabia o que o esperava do outro lado do mundo — e essa incerteza tornou tudo ainda mais difícil.
"Foi bem desafiador", conta. Sua jornada começou com uma escala na Polônia, onde já sentiu o peso do receio e do medo, especialmente por causa da barreira da comunicação. “Por mais que a gente use o Google Tradutor, ainda assim é muito difícil se fazer entender,” desabafa.
Da Polônia, Bruno enfrentou um trajeto cansativo e complicado: foram três ônibus até chegar a Kiev, a capital ucraniana. O aeroporto de Kiev está fechado por causa da guerra, impossibilitando voos diretos. Essa travessia terrestre por diversas cidades e estradas, muitas vezes sob risco, é um desafio à parte para quem chega ao país em meio a um conflito.
Ao contar para sua esposa sobre a decisão de se alistar, a reação inicial foi de choque. “Ela achou uma loucura”, lembra Bruno. Mas, com o tempo, Mônica compreendeu a vontade do marido de servir novamente, de fazer parte de algo maior. Hoje, mesmo distante, ela o apoia incondicionalmente. Bruno ressalta que a saudade e a distância pesam muito, principalmente porque a comunicação por internet na Ucrânia é instável. O país utiliza o sistema da Starlink, uma rede de internet via satélite, mas, em momentos de combate, é necessário até mesmo cortar o sinal para evitar que os drones inimigos — chamados “Charity” — que lançam pequenas ogivas (bombas) na cidade, consigam se orientar ou atacar.
Sobre os amigos, a reação foi quase dividida: cerca de 70% o chamaram de louco pela decisão de ir para uma guerra tão distante e perigosa. Já os 30% restantes, reconhecendo sua coragem, o apoiaram.
Bruno reflete sobre seu propósito: “Cada um de nós tem um chamado, e cada um consegue servir a humanidade com suas capacidades e competências. Isso nos torna essenciais em diversas áreas da sociedade.” Ele acredita que sua missão é honrar esse chamado, mesmo que isso o leve longe da família e da segurança.
Ele deixa claro seu posicionamento contra a invasão russa: “Não compactuo com a ideia de um país querer invadir outro sem motivos aparentes, apenas para reivindicar territórios, abusando da força e tirando o direito de liberdade de outra nação.” Bruno declara com firmeza: “Eu abomino o regime comunista, autoritário.” Essas convicções foram o que o motivaram a estar na Ucrânia, lutando para defender um povo que busca liberdade e dignidade.
Apoio
Bruno conta que apesar de atuar como voluntário, existe sim uma remuneração garantida para os combatentes. "A Ucrânia entende que o militar precisa de um salário para se manter no país e ter uma vida digna", explica. Além do pagamento mensal, o governo ucraniano oferece outros incentivos para quem decide vestir a farda e defender o país.
Mais do que um compromisso imediato, Bruno revela que a guerra na Ucrânia pode abrir portas para quem deseja se tornar um militar global, especialmente para quem faz parte do GUR, que é ligado ao Timur (divisão formada pelo governo ucraniano para atuar dentro e fora do território). “A experiência e o reconhecimento adquiridos lá podem ser usados para ajudar outros países, como Israel, por exemplo,” comenta. Hoje, várias empresas privadas especializadas em segurança militar mantêm parcerias com nações em conflito, criando uma ponte para soldados que querem atuar em diferentes regiões do mundo. E quando estas empresas precisam recrutar, o Gur serve como uma importante carta de recomendação.
Além disso, um benefício importante para os voluntários é a possibilidade de obter a cidadania ucraniana, passando a ter os mesmos direitos dos cidadãos locais e a chance de construir uma vida permanente na Ucrânia.
Sobre o preparo dos combatentes, Bruno reforça que a Ucrânia investe pesado na capacitação. “Não é possível entregar uma arma para alguém que não sabe como usá-la, para não jogar o combatente para a morte,” afirma com convicção. Por isso, todo soldado recebe treinamento adequado e equipamentos modernos. "O país está hoje muito mais organizado em relação às suas forças militares, e cada grupo tem sua especialidade para atuar com eficiência".
Uma das áreas que tem recebido atenção especial são os drones, usados em ambas as partes do conflito para atacar pontos estratégicos. “Os drones são fundamentais no campo de batalha atual, por isso o treinamento para seu uso é intensivo,” conta Bruno.
O dia a dia
Na prática, Bruno participa de operações específicas que exigem coragem e estratégia. Entre as ações que ele realiza estão os chamados “assaltos”, que, neste contexto, são ataques rápidos e coordenados a posições inimigas para surpreender e desorganizar o adversário. Além disso, ele atua em emboscadas — armadilhas montadas para capturar ou neutralizar o inimigo — e em missões de reconhecimento, que envolvem a coleta de informações estratégicas. Essa inteligência é essencial para o planejamento das brigadas, como as mecanizadas, que usam veículos blindados para se movimentar e atacar. O GUR, serviço de inteligência ucraniano onde Bruno está alistado, é responsável por fornecer dados importantes, incluindo imagens e informações obtidas por drones, para orientar essas operações.
E na complexa rotina de um voluntário na guerra da Ucrânia, a comunicação é um dos maiores desafios enfrentados por Bruno. Para facilitar o diálogo com os ucranianos, ele tem investido no aprendizado do inglês, idioma que ainda está aprimorando. “Ao retornar para a Ucrânia no início do próximo mês, devo ficar entre seis meses e um ano por lá,” conta Bruno, que tem a expectativa de, nesse período, se tornar mais fluente no inglês.
Ele também destaca que, idealmente, saber russo seria fundamental para entender o inimigo e conseguir extrair informações importantes diretamente dele. Essa barreira linguística é um obstáculo comum para muitos combatentes estrangeiros, tornando ainda mais desafiador o trabalho no campo de batalha e na coleta de dados de inteligência.
Atualmente, o trabalho de Bruno não está diretamente na linha de frente do combate. Sua atuação está mais vinculada à inteligência do governo ucraniano, atuando em um setor estratégico para as operações militares. No entanto, ele revela que sua próxima missão deverá ser mais próxima da linha de frente, uma necessidade imposta pelo momento delicado em que a Ucrânia se encontra.
Bruno explica que, com a chegada do verão no hemisfério norte, os ataques têm se tornado muito mais frequentes e intensos. Sobre o medo, ele é realista e sincero: “Há um medo constante, não só da população, mas também dos próprios soldados.” Porém, ele acredita que esse medo não é um inimigo, mas uma proteção. “O medo traz prudência. Quando se tem medo, se toma mais cuidado”, explica.
Para ele, é fundamental que a população não se acostume com a guerra. “A guerra não é algo para ser considerado normal,” alerta. Esse estado de alerta constante mantém todos conscientes do risco e da necessidade de proteção.
No meio desse cenário de tensão, Bruno conta que, felizmente, não perdeu amigos próximos na guerra, mas já conheceu colegas que foram abatidos. Cada notícia desse tipo gera uma apreensão profunda entre os soldados. “Sempre que fico sabendo que algum companheiro de farda foi abatido, sinto essa apreensão, porque não se sabe quando será a nossa vez”, desabafa.
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Gratidão e reflexão política
Vivendo uma realidade brutal e, muitas vezes, invisível aos olhos do mundo, o brasileiro relata com pesar os bastidores da guerra na Ucrânia. Segundo ele, há divisões internas no país que complicam ainda mais o cenário. Bruno lamenta que, especialmente no sul do território ucraniano, ainda existam núcleos que apoiam a Rússia. “A Ucrânia é meio dividida, assim como o Brasil, entre esquerda e direita”, compara.
Apesar disso, Bruno faz questão de exaltar os ucranianos gratos por sua presença no país. “Eles são muito solícitos. Muitos entendem que um desconhecido, de outro país, está ali para protegê-los, para defender sua casa, sua família… Eles sabem que isso é raro de se ver hoje em dia, essa empatia”, diz, emocionado.
Bruno relata que há uma corrente solidária da própria população para com os soldados. Muitas pessoas, mesmo com poucos recursos, fazem doações para ajudar os combatentes a se manterem. “O governo sozinho não dá conta de suprir todas as necessidades”, afirma. Ele já vivenciou situações em que foi tratado com generosidade apenas por estar uniformizado. “Apesar de não podermos nos comunicar, o agradecimento está nos olhos dessas pessoas — e isso é muito bom de ver”, conta, com orgulho.
Mas uma das coisas que mais incomoda Bruno é o que ele classifica como omissão da imprensa brasileira sobre o que realmente acontece na Ucrânia. “A informação que chega no Brasil é muito restrita. Não mostram a verdade. Tanto é que o povo brasileiro acha que a guerra acabou. Quando, na verdade, todos os dias tem conflito, tem mortes, tem ataques e pessoas precisando de ajuda”, dispara.
Segundo ele, a cobertura da mídia nacional dá ênfase ao avanço da Rússia, muitas vezes exaltando o poder militar russo, mas esquecendo de mostrar o sofrimento do povo ucraniano. “Eles atingem pontos civis. É gente inocente morrendo. E isso não aparece na TV”, denuncia.
Bruno vai além e aponta responsabilidade política. Ele afirma que o atual governo brasileiro, liderado por Luiz Inácio Lula da Silva, apoia indiretamente a Rússia, o que, segundo ele, se reflete claramente na forma como a mídia nacional trata a guerra. “O governo brasileiro até age certo quando se mostra parcial em conflitos internacionais. Mas chega uma hora em que é preciso tomar um lado. Quando está evidente quem está certo e quem está errado, como é o caso da guerra entre Ucrânia e Rússia”, defende.
Ele reforça que não se trata de apoiar líderes ou governos. “Não é o Putin, não é o Zelensky, não é o Lula que está no front. São pessoas comuns que estão lá, defendendo suas casas, suas famílias, suas vidas”, afirma com firmeza. Bruno denuncia que os ataques russos muitas vezes envolvem abusos praticados por grupos mercenários — empresas privadas que oferecem serviços militares, como o notório Grupo Wagner. “Homens armados invadem casas e abusam de mulheres. É disso que estamos falando”, acusa.
Diante disso, ele acredita que o Brasil deveria ter adotado uma postura mais firme. “Eu escolhi não ficar parado. Eu escolhi não ser omisso. Porque a gente nunca sabe quando a nossa casa vai precisar de proteção. Estando lá, eu também estou me preparando, assim como vários outros brasileiros e estrangeiros”, declara.
Bruno enfatiza que os brasileiros que estão lutando na guerra não apoiam o governo Lula e repudiam as declarações do presidente sobre o conflito. “Vou continuar lutando enquanto estiver respirando. Fazer o que precisa ser feito. Só Deus sabe quanto tempo ficarei por lá”, conclui, em tom firme.
Retorno e orientação
Bruno está com data marcada para retornar ao território ucraniano, dia 7 de julho. No dia 10, ele deve se apresentar oficialmente para integrar a Legião Estrangeira Internacional, agora como parte formal do GUR — o serviço de inteligência militar da Ucrânia. O retorno marca um novo capítulo na trajetória de Bruno, que, cada vez mais, enxerga sua vida como dedicada à área da defesa. “É a minha missão”, afirma.
Na Ucrânia, Bruno é conhecido pelo nome de guerra “Drax”, uma identidade adotada por muitos combatentes estrangeiros como forma de preservar a segurança e facilitar a integração com o exército local. Agora, com a nova função na Legião Estrangeira, ele estará mais próximo das ações de combate, mas com a experiência acumulada nos setores de inteligência e operações especiais.
Ao falar sobre o futuro, especialmente sobre um possível pós-guerra, Bruno diz que pretende seguir carreira na área militar ou de segurança estratégica. Para ele, esse é um caminho natural. “É algo que passou a fazer parte de mim. Não tem mais como voltar a ser o mesmo depois de tudo que vivi”, revela.
Quando questionado sobre o crescente interesse de jovens brasileiros em ir à Ucrânia, Bruno é direto. Sem romantizar a experiência, ele deixa um alerta firme: “A guerra não é um jogo como Call of Duty, Medalha de Honra ou qualquer outro jogo. Aqui é vida real. Se o brasileiro quiser vir achando que vai ser herói, não vai ser herói. Vai ser mais um lutando.”
Bruno faz questão de frisar que não se trata de turismo ou aventura. A realidade no front é dura. “Vai ver coisa feia. Tem batalhão que não tem estrutura muito boa, e isso pode ser um desafio. É importante estar preparado para dificuldades”, avisa.
Além dos riscos, ele também aponta questões práticas: o custo de se manter na guerra é alto, e muitas vezes o apoio fornecido pelo governo ucraniano não é suficiente. Por isso, Bruno está em busca de um “padrinho” — alguém que possa ajudá-lo com equipamentos de melhor qualidade. “O salário que recebo lá não cobre tudo. A gente depende também de doações. Quem quiser vir, precisa entender isso.”
Bruno orienta os interessados a refletirem profundamente antes de tomar qualquer decisão. “É preciso saber o que te move. Tem que valer a pena. Vai enfrentar treinamento rigoroso, vai passar dificuldades, sentir medo. Tem que saber por que está indo”, alerta.
Sua fala é um chamado à consciência e responsabilidade. Ao mesmo tempo em que defende a causa que abraçou com convicção, Bruno não vende ilusões. Para ele, lutar por um povo é um ato de empatia e coragem, mas precisa ser feito com preparo, clareza e verdade.
Propósito
Com voz firme e olhar determinado, Bruno encerra sua fala com a mesma convicção que o levou a atravessar o mundo para lutar por um povo que sequer conhecia.
Me chamo Drax, não tenho idade, não tenho rosto. Sou um brasileiro que está ajudando quem precisa e farei o possível para ajudar a estabelecer a paz e a ordem.”
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Situação atual
A guerra entre Rússia e Ucrânia segue com combates intensos, principalmente na região leste, onde as forças russas avançam lentamente em áreas como Donetsk e próximas ao rio Oskil. Apesar disso, os ucranianos têm conseguido conter a ofensiva em pontos estratégicos como a região de Sumy, próximo à fronteira.
Ambos os lados continuam usando drones e mísseis de longo alcance, com ataques frequentes a infraestrutura civil, como ocorreu recentemente na cidade de Dnipro, que sofreu bombardeios causando mortes e feridos. Enquanto isso, a economia ucraniana enfrenta dificuldades graves, dependendo fortemente do apoio financeiro e militar do Ocidente, que tem mantido o envio de recursos e sanções contra a Rússia.
Além disso, há relatos de que a Rússia pode receber apoio militar da Coreia do Norte, aumentando o risco de ampliação do conflito. Do lado diplomático, ainda não há avanços concretos em negociações de paz, com o conflito se mantendo em um impasse.
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