Ciro Gomes vive, em 2025, talvez o momento mais desafiador de sua longa e intensa trajetória política. Depois de quatro candidaturas presidenciais, décadas de atuação no campo progressista e uma postura firme — por vezes intransigente — em relação aos rumos do Brasil, ele se vê hoje diante de uma encruzilhada: reconstruir sua relevância ou assistir à diluição de seu protagonismo. Não há dúvidas de que sua biografia o credencia a seguir influente, mas o cenário político atual exige algo que nem sempre esteve em seu repertório: adaptação estratégica.
O ambiente partidário que o cerca tornou-se mais instável do que nunca. O PDT, legenda pela qual disputou as últimas eleições e que serviu de abrigo para seu projeto de terceira via, hoje é palco de tensões crescentes. A saída de seu irmão, o senador Cid Gomes, para o PSB, abriu uma fissura difícil de ignorar, levando consigo parte substancial da base política cearense que durante décadas sustentou o projeto político dos irmãos. Além disso, o PDT, sob a presidência de Carlos Lupi, aproxima-se do governo Lula, adversário histórico de Ciro, num movimento que contraria frontalmente seus princípios e suas declarações mais recentes. Há deputados pedindo sua expulsão, enquanto a direção tenta contornar a crise com discursos conciliadores. Ciro, por sua vez, ainda não rompeu oficialmente com o partido, mas já observa alternativas viáveis, entre elas o União Brasil e até o PSDB, em um possível retorno às suas origens.
Apesar de ter afirmado categoricamente, após a derrota de 2022, que não disputaria mais cargos públicos, Ciro começa a reavaliar sua decisão. Em conversas com interlocutores e líderes da oposição, já admite que pode “ser tudo”, incluindo, claro, novamente candidato à Presidência. A resiliência de seu nome nas pesquisas, especialmente em cenários sem Lula e Bolsonaro, é um dado a ser considerado. Em sondagens recentes, Ciro aparece como líder em intenções de voto nesse vácuo, com cerca de 19%, superando nomes como Fernando Haddad e Tarcísio de Freitas. Essa margem o reposiciona como um nome competitivo, sobretudo se conseguir costurar alianças amplas e reposicionar seu discurso sem perder identidade.
Mas o caminho de volta ao Planalto não é o único possível — nem talvez o mais provável. O Ceará, onde construiu sua base, também se apresenta como palco para um eventual retorno ao protagonismo executivo. Ciro tem admitido a aliados que, diante da “necessidade de salvação do Ceará”, pode ser candidato ao governo estadual em 2026. Mesmo negando pretensões formais, já articula alianças, inclusive com lideranças bolsonaristas, como o deputado estadual Alcides Fernandes (PL), a quem chegou a elogiar publicamente como potencial candidato ao Senado. Essa aproximação com setores da direita revela uma disposição incomum em sua trajetória, mas que pode ser interpretada como pragmatismo eleitoral, ou mesmo uma tentativa de consolidar uma frente ampla contra o PT de Elmano de Freitas, atual governador.
Esse movimento, entretanto, carrega riscos. Ao buscar alianças com o PL e com figuras que representam o bolsonarismo no Ceará, Ciro pode minar parte do capital simbólico que ainda possui junto a setores progressistas que o apoiaram no passado. É uma operação delicada: formar alianças para vencer sem se descaracterizar. Em paralelo, a relação com Cid, embora politicamente abalada, parece dar sinais de reconciliação. O próprio senador declarou recentemente que, apesar das diferenças no plano estadual, jamais se colocaria em oposição ao irmão em uma disputa nacional. Palavras que, no mínimo, reabrem caminhos para uma recomposição do clã político dos Ferreira Gomes.
Ciro, portanto, está diante de um duplo desafio: reconstruir sua base política e reconfigurar sua narrativa. Ele já não pode mais contar com a força quase inabalável do “irmão mais velho e líder incontestável” no Ceará. Também não pode mais sustentar, isoladamente, o discurso de terceira via contra dois polos consolidados sem abrir mão de articulações amplas. Precisa, mais do que nunca, unir inteligência estratégica à paixão combativa que sempre o guiou. O Brasil e o Ceará seguem em transformação, e Ciro parece disposto a não ser apenas espectador. Se optará pela arena presidencial ou pelo retorno ao Palácio da Abolição, ainda é cedo para afirmar. Mas uma coisa é certa: sua história está longe de acabar. E os próximos capítulos prometem ser decisivos.
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