O jantar entre Lula e Xi Jinping deveria ter sido um momento solene, reservado à troca de interesses estratégicos entre duas potências em desenvolvimento. Em vez disso, virou um espetáculo digno de nota diplomática de repúdio – só que vinda da própria comitiva brasileira. É difícil dizer o que mais espanta: se a intromissão inapropriada de Janja, a complacência indulgente de Lula ou o vazamento oportunista que escancarou para o mundo inteiro a desordem palaciana.
Rosângela da Silva, conhecida como Janja, resolveu improvisar em território chinês. Diante do presidente Xi Jinping e sua esposa, tomou a palavra — sem cargo, sem credencial diplomática, sem qualquer preparação — para falar sobre os perigos do TikTok. Um tema relevante, sim, mas no contexto de uma reunião bilateral de alto nível, entre Estados soberanos, não é com emoção e ativismo que se debate regulação digital. A presença da primeira-dama virou intervenção, e a intervenção virou constrangimento.
Segundo relatos vazados da própria equipe governamental, o mal-estar foi visível. A primeira-dama chinesa, Peng Liyuan, não escondeu o incômodo. E quem conhece a cultura política de Pequim sabe: constrangimento entre líderes não se manifesta em palavras, mas em gestos frios, silenciosos — e inesquecíveis.
A resposta de Lula não foi melhor. Em vez de reconhecer o deslize e tratar o episódio com sobriedade, preferiu atacar os “fofoqueiros” de sua equipe e justificar a fala de Janja como se estivesse em um churrasco familiar e não na liderança da nação. “Ela tem formação, não é cidadã de segunda classe”, disse. Ninguém questiona sua cidadania — o problema é a insistência em usá-la como se fosse ministra, conselheira, estrategista e influenciadora digital de Estado, tudo ao mesmo tempo.
O que o episódio revela, no fim das contas, é a desordem no núcleo mais próximo do poder. Ministros que vazam informações confidenciais para a imprensa — em ato de sabotagem interna ou tentativa desesperada de lavar as mãos. Um presidente que não impõe limites à atuação da esposa — e, pior, encara qualquer crítica como ataque pessoal. Uma primeira-dama que, deslumbrada com o palco, esquece que não foi eleita para protagonizar nada.
O Brasil, mais uma vez, paga o preço da improvisação institucional. A política externa virou cenário de vaidades e melindres, enquanto aliados internacionais tomam nota do nosso amadorismo. A visita que deveria aproximar o Brasil da China deixou um rastro de ruído, desconforto e descrédito. Um espetáculo lamentável — com plateia global e consequências imprevisíveis.
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